CONTO ERÓTICO
MERY, o meu professor de castelhano, homem maduro, experiente, de voz quente e sensual. Um latino cavalheiro, dos tais que oferecem flores às mulheres, daqueles que fazem agrados, dos que nos rodeiam de todas as atenções, nos miram de longe, nos olham dentro dos olhos profundamente e nos acariciam só com o deslizar desses olhares. Era assim Mare, com perfume a maresia e sorriso nos lábios. A sua voz era uma promessa, as suas palavras uma sinfonia de paixão. A amizade transformou-se em atracção, depois em paixão, em desejo. Aliado ao facto de eu já me encontrar livre, o que lhe permitiu avançar para o que ele desejara desde o momento em que nos conheceramos (palavras suas).
Também eu tentei ensinar-lhe algumas palavras em português mas não fui tão feliz como professora como ele foi comigo.
Mare ria e dizia:
- Anna, Anna, eres una mujer que necesita vivir ‘ like a bird’.
Esta sua mistura entre o espanhol e o inglês devia-se ao facto de ser a única forma de conseguirmos manter um diálogo de modo a que nos entendêssemos minimamente. O que eu não conseguia fazer-me entender em português, dizia em inglês e ele respondia-me em espanhol ou inglês, conforme eu o entendesse ou não.
Ele fingia buscar um passatempo, mas queria uma companheira. Eu fugia da prisão de um relacionamento que não me deixasse ‘voar’, naquela época, e desejava ficar a seu lado. Eram as contradições que me deixavam confusa, as minhas e as dele. Na verdade, nenhum dos dois sabia bem o que pretendia do outro, ou o que existia entre nós. A atracção forte, a paixão intensa sem dúvida que sim, a amizade também. Um beijo ou outro fugidio e nada mais. Músicas dedicadas como esta:
Curiosamente demorámos bastante tempo até colarmos os nossos corpos nus, o que veio a acontecer apenas em meados de Janeiro de 2008. Os nossos encontros eram recheados de riso, música, alegria, beijos quentes, palavras sedutoras, toques que ferviam na pele, que derretiam os sentidos e me faziam suspirar e ansiar o fim da espera que ele prolongava, propositadamente ou não. A promessa de uma noite inteira a seu lado ia sendo adiada de dia para dia, por dificuldades horárias de um ou de outro, além do constante saltitar de ambos por outras flores. Não deixava de me enervar, de certo modo, aqueles desencontros constantes.
Enquanto isso, ia mantendo o affair fortuito com OPeter, e conhecendo outras pessoas, homens na sua maior parte. Não, não me relacionei com nenhum deles, nem meros casos de uma noite só, nem sequer um beijo.
Apenas um surgiu ainda antes do fim do ano que veio mais tarde a tornar-se uma das três pessoas mais importantes que conheci naquele meio.
Falo de Edu. Este nome ainda me faz sorrir. Durante meses a chamá-lo de Edu até ao dia em que tudo mudou e me revelou o seu nome verdadeiro.
Aproveito já para falar um pouco sobre ele. O momento em que o conheci não foi o mais importante. Foi o facto de o conhecer, o que ele mudou em mim, o que me fez sentir e as loucuras que quase me fez cometer, como por exemplo colocar a possibilidade de virar costas ao meu país e partir para outro, a milhares de quilómetros daqui. Mas como surgiu ele na minha vida?
Devido ao conhecimento com Mare, passei a frequentar locais onde encontrava outras pessoas do mesmo idioma que o seu. Foi assim que passei a conhecer mais gente oriunda dos quatro cantos do mundo.
Entre essas pessoas conheci um dia Edu. Aproximou-se, apresentou-se e começámos a conversar, numa daquelas noites em que eu já estava de novo com os nervos em franja pelos aparecimentos e desaparecimentos de Mare. Atitude habitual nele, como passei mais tarde a verificar e a deixar de dar relevância. Muito mais tarde, aliás. Edu era divertido, simpático, meigo e extremamente atencioso. Apresentava-se de olhos esverdeados, olhar atrevido, sorriso malandro e cabelo sempre meio despenteado. E claro, sempre rodeado e solicitado pelas amigas que se derretiam perante aqueles olhos verdes de um homem tão guapo. Se estás a ler-me agora, lembras-te disto?
A segunda ou terceira vez que nos cruzámos, passámos a noite juntos. Na praia, à beira-mar. Poucas palavras trocadas, principalmente porque nenhum de nós estava familiarizado com o idioma do outro. Imaginem uma portuguesa e um espanhol (bem, ele não era espanhol, apenas falava espanhol, mas vou omitir a sua nacionalidade, pleo menos por agora), a tentarem fazer sexo usando as expressões típicas de cada país. Assim, foi melhor o quase silêncio, naquela aproximação da ‘primeira vez’.
Foi bonito, foi carinhoso, começou por uma bela amizade colorida. Ele tinha várias, conforme me contou dias depois, enquanto eu sorria e lhe respondia: ‘e agora uma portuguesa’. Amigos coloridos? Agradou-me a ideia.
Foi assim que o ano de 2007 chegou ao fim e deu lugar ao grande ano de 2008.
2008. O início da caminhada na direcção do que sou agora e do que tenho. Ganhei mais do que perdi nesses doze meses que foram o ano de 2008, mas ainda hoje quando fecho os olhos e penso nos momentos passados, quase posso sentir as mesmas emoções que vivi, os mesmos odores, os toques, as músicas e as imagens que desfilaram perante os meus olhos.
Venci e fui derrotada. Ganhei e perdi. Do que ganhei, voltei a perder mesmo antes do ano findar. Sem querer perder, dei cada passo na incerteza do que fazia. Julguei que lutava por manter comigo o que me era importante e apenas movi os dedos num gesto de afastamento, sem que me desse conta. Sem que o desejasse.
Há recordações que nunca se esquecerão, palavras que ficarão para sempre gravadas na memória e que fazem de mim o que sou, com todas as reacções inconstantes que já nem sei bem se são minhas ou da Anna.
Amei, vivi, chorei, ri, apaixonei-me vezes sem fim e aprendi a verdade do que é o Amor. E amar não é apenas sorrir, é sentir dor, é lutar, é querer agarrar cada minuto do tempo que se tem para viver, é colocar a felicidade do outro antes da nossa.
2008. O ano de todas as emoções, do crescimento, do conhecimento, da verdade, do salto para a realidade.
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