“É a primeira vez que estou sentando nesta cadeira da presidência”, diz Ideraldo Luiz Beltrame antes de começar a entrevista. Ele foi recém-eleito (em uma noite bem conturbada) o presidente da Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo (APOGLBT), da qual é sócio-fundador e pela qual pretende fazer uma abertura maior no lado comercial pela garantia da continuidade dos projetos que realiza. Exato, a APOGLBT não realiza apenas o maior evento cívico do mundo, mantém ainda projetos paralelos como debates e assistência jurídica. Mas como tudo tem um custo, incluindo aí esses projetos, a entidade precisa se manter financeiramente. E deve começar a trilhar um caminho promissor se depender da visão de seu novo presidente, disposto a “ter gente que discute marca, discute negócios, porque tem um monte de gente usando a marca da Parada sem pagar um único centavo!”. Na entrevista a seguir, Ideraldo, conhecido pelos mais próximos como Id, explica o envolvimento partidário de militantes LGBT, declara a entidade como suprapartidária e conta os planos futuros da nova gestão, que será a primeira a ter quatro anos de mandato para realizar seu trabalho.Eu vim aqui na noite da eleição e estava bem movimentada a entrada.A assembleia de eleição estava transcorrendo normalmente, mas nós tivemos um incidente na portaria com o empresário Douglas Drumond. Ele havia feito uma matéria em um site convocando as pessoas a virem aqui impedir a eleição e se necessário tirar a tapas o tesoureiro Manoel Zanini de seu lugar. Mas por que ele fez essa eleição anti Parada? Ele chegou a dizer o quê ele queria?Para ele, e ele afirma isso por escrito, a diretoria que estava antes não tinha capacidade para administrar a Parada do ponto de vista comercial, portanto ela deveria ser ampliada na participação comercial. Então ele chegou aqui em agosto com 70 pessoas querendo eleger a nova diretoria, mas isso é ilegal. Aqui não é lugar público, é como um sindicato, ninguém entra alheio dizendo que vai eleger diretoria. Eu disse às pessoas que vieram com ele que elas eram muito bem vindas à Associação, mas para votar precisavam se filiar, participar da entidade. No dia 7 de outubro, o dia da eleição, ele voltou e nós tivemos que restringir com policiais militares a entrada porque havia uma ameaça de violência que era pública, estava na imprensa. Ele quis entrar como imprensa e pedimos a identificação dele. Ninguém vai entrando assim nos lugares sem se identificar. Conseguimos restringir a entrada dele e fazer a eleição tranquilamente.E existe esse ponto de vista comercial?A primeira pergunta que me fizeram foi porque algumas casas estão fora da Parada, porque elas acham caro pagar 10 mil reais. A Bubu e a The Week acham que desse jeito não dá. Eu respondi que tinha acabado de sair de um processo conturbado que me elegeu e precisava tomar pé da coisa ainda. Eu não sei se isso é caro ou é barato. Eu posso dizer que por meios legais e lícitos eu posso propor um levantamento de quanto ganha por ano a The Week e a Bubu com o segmento GLBT e aí a gente coloca em discussão com o movimento se ele acha que é caro 10 mil reais para a participação no evento. Quando nós criamos essa taxa em 2000 era porque a gente entendia que era uma das maneiras com que o comércio GLBT contribuísse com a manutenção da Associação. A gente fez em progressão geométrica esse evento que hoje é responsável pela segunda maior arrecadação do Estado mais rico do Brasil e a gente não tem absolutamente nenhuma devolução disso. Esse é um dos pouquíssimos mecanismos hoje para fazer com que o comércio GLBT contribua para a manutenção, para a conta de luz, água, para que funcione. Ta aí uma proposta para a nova gestão, precisamos ter esse diálogo com os representantes do comércio, não só do segmento GLBT, mas de toda a área comercial, e profissionalizar isso dentro da Parada. Ter captador de recursos da iniciativa privada, garantir espaços para que eles sugiram e participem. Vamos negociar. Você acha importante abrir mais comercialmente a Parada? Você acha necessário uma comercialização maior?Eu penso que não tem comercialização de mais ou de menos. A Parada tem um lado comercial, ponto. Não pode ter meio termo sobre isso. Nos acusaram já mais de uma vez de que nós não temos staff para lidar com a questão comercial. Mentira, quem quiser conferir isso veja que em 2000, nós tivemos um convênio com um portal de internet que encheu a Parada de pirulitos. A gente não tem alguém do comercial aqui, e precisa ter. Gente que discute marca, discuta negócios, porque tem um monte de gente usando a marca da Parada sem pagar um único centavo. A Parada tá registrada na Junta Comercial. É que a gente é militante, movido por paixão. Até 2003 a gente fazia as coisas meio mambembes, pedia dinheiro na noite, fazia coisas no computador de casa mesmo. Em 2000 teve uma coisa que nós não percebemos, estávamos tão envolvidos com a militância que não vimos. O olhar do ativista é perigoso, porque ele é tão apaixonado que ele não enxerga isso. Tinha anúncio de página dupla no Estadão dizendo que esse portal tinha orgulho de ser patrocinador da Parada. Isso há 10 anos. Hoje em dia é muito mais fácil. Descobriram que há um circuito de consumo aí. Alguns chamam de Pink Money. E a Parada tem um lado turístico também, quem vem traz dinheiro para passar alguns dias em São Paulo.Isso foi acontecer depois de 2003, um ano divisor de águas. As Paradas seguintes começam a ter esse movimento. Hoje a gente tem clareza que a Parada tem um corte comercial que precisa ser explorado.O que dá para fazer hoje?Hoje dá para fazer isso de forma profissional, ter ao seu lado um gerente comercial, que respeito os estatutos, o regimento, a questão do ativismo. Uma coisa não exclui a outra. Mas é preciso ter esse olhar comercial e o quê isso pode representar de retorno para os LGBT. Ligar conquistas políticas com a questão comercial. Porque se eu consigo fazer com que planos de saúde onde parceiros homossexuais possam colocar seu parceiro, se eu associo isso ao lado comercial, eu garanto com isso mais facilidade para aprovar leis no Congresso, porque a gente já tem isso na prática, na realidade do dia a dia. Existem projetos o ano todo que custam dinheiro também. Essa é uma questão que também pode ser resolvida com um lado comercial. Ser parceiro comercial da Parada significa de alguma forma, em algum momento, ser parceiro de projetos de ampliação da visibilidade de direitos para GLBT. A Parada sempre manteve internamente, por exemplo, coordenadoria de trans para discutir as questões específicas. Isso custa dinheiro, esse trâmite de mudar nome, por exemplo. Tem trâmite jurídico, tem que ir para Brasília às vezes. Essas coisas todas são mantidas pela gente e têm um custo. Tem também o Entre Homens. A assistência jurídica é feita com advogados que são parceiros normalmente sem nenhum vínculo financeiro. Você sempre foi do conselho de sócios fundadores. Não estar, digamos, na linha de frente, te deu alguma visão diferenciada, alguma ideia nova com um tempo para pensar?Inclusive para interferir, me convidavam para reuniões, eventos. A Parada não é só o dia da Parada, começamos com um dia, virou uma semana e agora virou um Mês do Orgulho porque tem uma série de atividades. Acho que a Parada amadureceu. A gente apresentou como proposta para esta gestão, primeiro: a gente tem que terminar essa gestão em 2014 com uma sede, não pode uma organização que movimenta a segunda maior arrecadação do Estado viver em uma loja alugada de baixo padrão de infra-estrutura. Os projetos que a gente faz não prevêem o pagamento do aluguel, por exemplo. A contrapartida para a entidade receber os recursos do projeto é ter uma sede, isso para mim é uma questão fundamental. E não vai ter corte político, cor ideológica, Dilma, Serra, Kassab, Alckmin. Quero falar com todo mundo, prefeito, governador, ministro, presidente se for necessário.Uma critica muito constante ao movimento é q ele é partidário, pende para um lado. Como dialogar com todos? É preciso ter uma atitude suprapartidária.A Associação prevê inclusive em seu estatuto que ela é uma associação suprapartidária, não apartidária, sem partido. Porque não pode existir um movimento social, um movimento de luta que luta por mudar a ordem estabelecida não tomar partido. É claro que militantes e ativistas querem carregar a bandeira, pegar microfones e bradar. Nós somos uma associação que tem q representar o gay malufista, o gay petista, o gay Verde, o gay sem partido. Todos os movimentos sociais que lutam por direitos têm pessoas envolvidas neles com interessados muito apaixonados. Todo mundo tem que ter os mesmos espaços de participação. É claro que quem está na direção tem um certo olhar, e que é partidário. Por que quais são os gabinetes dos vereadores, deputados, etc, que estão abertos a nos apoiar? Então não tem como negar muito isso. A proposta que eu tenho é construir esse suprapartidarismo. E tem mais planos para os próximos quatro anos?É preciso também garantir uma descentralização da Parada, porque ela age muito em torno do centro de São Paulo. E a periferia, pelo menos nas nossas cabeças, não é um dado sociológico, é responsável por grande parte desse movimento no dia da Parada, ele vem desses bairros. Queremos trabalhar com os grupos que existem. Precisamos retomar as atividades internas, discutir as questões de cada grupo novamente, gays, lésbicas, travestis. É preciso ter ainda um representante na Assembleia Legislativa, independente do partido. Para fazer isso não tem eleição, assembleia, tem que participar, se incorporar. Precisamos abrir mais canais de comunicação, discutir coisas como essa contribuição mensal sem ser problemática. Agora são quatro anos para fazer tudo isso em vez de dois. A gestão era de dois e reelegível por mais uma gestão, mas nunca aconteceu isso. A última gestão modificou o estatuto e passou de dois para quatro anos. A nossa vai ser a primeira. Mudou porque a gestão que estava entendeu que dois anos era pouco tempo, inclusive para parcerias comerciais. Tem parcerias comerciais em que eu preciso oferecer algo maior, coisas a longo prazo, a empresa pede que nos próximos dois anos façamos o evento X. Tem que ter esse tempo maior. Você é filiado a algum partido?Não tenho partido, mas meu coração não é partido como o do Cazuza. Não sou filiado a partido nenhum, mas talvez seja a hora de fazer isso.
pride
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