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sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Coordenadora LGBT paulista conta ao Mix as ações para 2012


O Governo do Estado de São Paulo vai ter como uma de suas prioridades para 2012 na questão LGBT construir o novo Plano de Enfrentamento à Homofobia, além de eleger seu Conselho Estadual LGBT e intensificar o diálogo com os 645 municípios paulistas. É o que afirma ao Mix na entrevista a seguir a advogada Heloísa Gama Alves, titular da Coordenação de Políticas Públicas para a Diversidade Sexual de São Paulo.

Segundo Heloísa, há quase um ano à frente da Coordenação, o órgão da Secretaria de Justiça paulista vai continuar dando atenção especial ao segmento T, o que mais sofre com discriminação, e não tem o papel de interferir nas candidaturas de pessoas LGBT nas Eleições 2012, mesmo considerando o fato algo positivo. Confira:

É produtivo você fazer parte do GADVS (Grupo de Advogados da Diversidade Sexual) e do governo ao mesmo tempo?
Estou lá desde a fundação. Faz um ano e meio que existe, a gente criou em junho de 2010. Hoje eu me afastei um pouco, antes eu era mais ativa no GADVS. Mas eu ainda frequento as reuniões, claro que como gestora às vezes eu deixo de dar alguns pitacos até para não tirar a autonomia deles. É positiva a abertura que o grupo tem comigo, com certeza. Apesar de que bom diálogo eu tenho com todo mundo. A gente está aqui para isso, a Coordenação é um espaço de diálogo, a gente só faz a ponte entre sociedade civil e poder público, mas é um espaço para toda a sociedade civil. A gente procura não fazer distinção com ninguém.

2012 é ano eleitoral e o cotidiano do poder público se altera um pouco. Vai dar para fazer tudo o que vocês planejaram? Vocês já estão considerando isso?
É um ano um pouco mais complicado, por exemplo, na interlocução com os municípios, que é uma coisa muito importante para nós. Então desde que eu entrei aqui eu viajei bastante com a Deborah Malheiros (técnica da Coordenação). Procuramos ir a várias Paradas, demos várias palestras no interior, chegamos a dialogar com alguns prefeitos e prefeituras para ver a possibilidade de criação de divisões relacionadas à questão LGBT. Neste ano por ser de eleição é um ano mais complicado para nós termos essa interlocução, a gente vai procurar ter com a sociedade civil do interior, mas já dificulta um pouco o diálogo com o poder público, sem dúvida nenhuma. Conversamos com todos os municípios indistintamente de partido, isso é uma coisa bacana. Temos diálogo até com municípios que são administrados por pessoas de outro viés partidário, diferente do que o que está no governo do Estado. A gente não pode misturar a questão partidária, senão prejudicamos todos nós.

O Brasil já tem 96 pré-candidaturas LGBT para as Eleições. A Coordenação tem algum papel com os pré-candidatos aqui de São Paulo ou não?
Não, nós procuramos não nos envolver nessas questões de candidatura LGBT. Eu particularmente acho que é uma coisa extremamente positiva. Acho indiferente se a pessoa é lésbica, gay, acho importante a pessoa ter condições de nos representar bem no poder Legislativo, mas eu acho muito legal ver que tem mais gays, mais lésbicas, temos candidaturas de transexuais. Isso mostra que a gente está se empoderando dos nossos espaços.

Quando eu falei com você no ano passado você disse que a prioridade seria o segmento T. Continua sendo?
Não é que é prioridade, mas é que necessita de mais atenção, tem que se pensar mais. A prioridade é todo o segmento LGBT, mas nós procuramos sim nos preocupar em ter um diálogo com as outras secretarias e pensar o que nós podemos melhorar para diminuir essa vulnerabilidade da população T. Eu acho que a inclusão social, a questão educacional, a questão do mercado de trabalho são importantes e temos muito ainda o que avançar. Uma preocupação da Coordenação sempre foi pensar em políticas públicas mais inclusivas para as transexuais e travestis.

Teve um ponto bem positivo que foi a ocupação da estação da Sé do Metrô por um talk show sobre transexualidade e travestilidade. Foi o que vocês estavam esperando?
Foi, claro que quando a gente pensou a gente ficou um pouco receosos, mas foi positivo tanto para o Metrô quanto para a Secretaria da Justiça. Eu penso como coordenadora que visibilidade não pode mais ser aqui dentro, a gente sempre fez esses dias de visibilidade aqui no nosso Espaço da Cidadania e sempre as mesmas pessoas acabam vindo. Nós não conseguíamos atingir a população de uma maneira geral, transmitir a nossa mensagem de respeito, de promoção da cidadania para a população de modo geral, ficava restrito. A idéia de levar a visibilidade de travestis e transexuais para o Metrô foi justamente essa, de ampliar, de realmente promover a cidadania das travestis e das transexuais, aproveitando o momento de divulgação da nossa campanha junto com o Programa Estadual de DST/AIDS para as travestis. O Metrô foi muito parceiro, desde o primeiro momento. Meu primeiro contato com eles foi no final do ano, entre o Natal e Ano Novo, eu tive uma ótima acolhida por parte da direção. Eles foram extremamente parceiros, abraçaram a idéia, a distribuição dos cartazes, são 120 distribuídos em 58 estações, eles já disseram que querem continuar com essas campanhas e já se mostraram dispostos a realizar outras atividades comemorativas iguais.

Eu conversei com o pessoal do Metrô uma vez e eles me disseram que recomendam aos seguranças não abordar casais de mesmo sexo, a não ser em casos em que se abordariam um casal hétero também, claro.
Eles têm um cuidado muito grande com essa questão, eles capacitam continuamente os funcionários, sempre que eles têm alguma dúvida eles recorrem aqui à Coordenação. Acho que o Metrô é uma companhia que aprendeu a lidar com isso.

Essas empresas acabam buscando a Coordenação como uma referência quando querem uma capacitação, quando querem fazer a coisa da forma certa. Essa procura tem aumentado?
Aumentou sim, as empresas estão mais interessadas nisso. Até porque hoje em dia a mídia divulga muito mais as questões LGBT. Então, por exemplo, você viu a repercussão que teve o caso do Laerte, por exemplo, que apesar de ser uma coisa um pouco diferente trouxe outra discussão, que é a discussão do banheiro, das travestis, das transexuais. Quando tem uma agressão a um gay também hoje em dia não se fica em silêncio. Não tem mais como fugir do assunto. Seja no interior, seja aqui na capital, a gente sempre acaba tomando conhecimento. A mídia tem ajudado muito nisso, isso força as empresas a repensarem a forma de tratamento à população LGBT e a preocupação de realmente capacitar seus funcionários a lidar com essa temática. Os órgãos privados também acabam nos procurando também com essa questão das travestis e transexuais do nome social, eles muitas vezes têm dúvidas. Procuram na intenção de querer fazer certo. Hoje de manhã mesmo eu estava respondendo uma dúvida de uma pessoa que trabalha em um órgão privado e queria saber como tratar a questão do banheiro no caso de trans e do nome social.

A gente tem também outro lado que é o das denúncias de homofobia que a Coordenação recebe contra empresas que cometem discriminação. No ano passado eu lembro que vocês divulgaram que aumentou, continua subindo o número de denúncias?
Continua aumentando. Só neste ano de 2012 a gente já teve seis processos instaurados com base na Lei Estadual 10.948, de 2001. Não estamos nem na metade do ano. Isso mostra que as vítimas estão fazendo denúncia, a lei está sendo divulgada - claro que não é aquela divulgação que nós gostaríamos, nós poder público sabemos que temos muito que melhorar no tocante à divulgação dessa lei -, mas aqui na Secretaria da Justiça há uma preocupação contínua da secretária de que nós nos esforcemos para sempre estar divulgando.

Neste ano o governo paulista abriu a possibilidade para o servidor se assumir LGBT no recadastramento anual também.
Isso é uma demanda que vem do Plano Estadual de Enfrentamento à Homofobia.

Então dá para dizer que a demanda que nasce no movimento militante chega ao poder público?
Sim, ela é executada. Isso é uma coisa positiva, mostra uma abertura do governo. O Plano é muito importante para o poder público porque através dele todas as secretarias estaduais podem planejar, atender as demandas do segmento LGBT. As duas conferências estaduais LGBT foram para isso: a sociedade civil traz as demandas, saem as propostas, dentro dessas propostas o poder público constrói o seu plano que é para atender essas demandas. Algumas são exequíveis, outras não são, mas é muito importante para o poder público ter essas demandas que a sociedade tem trazido através das conferências.

E a Coordenação, que é estadual, dialoga com a Cads, que é municipal? Existe uma parceria?
Nós procuramos dialogar com todas as coordenações, sejam divisões, coordenações, conselhos, que existem no Estado. Com a Cads na capital a gente tem um diálogo muito bom, uma parceria boa porque a gente acha importante, afinal São Paulo é uma cidade muito grande, é capital, não dá para ser de outra forma. Por exemplo, com relação à Lei 10.948 a gente tem concentrado mais os casos da capital para a Cads, a gente repassa para ela, para poder justamente dar mais atenção ao interior, a gente tem que interiorizar mais as questões. Sair um pouco da capital, a capital está muito bem encaminhada com a Cads, eles têm feito um trabalho bacana desde a criação. Então a gente dá uma atenção maior ao interior.

O desafio então é conseguir chegar a cada cidade do interior de São Paulo.
O Estado tem 645 municípios, a gente não consegue cobrir tudo. O que a gente tem procurado fazer é sempre estar nas regiões, pelo menos estar presente ou eu ou a Deborah. Sempre que nós recebemos convites a gente procura atender esses convites para mostrar um pouco do nosso trabalho.

Vocês dialogam, ficam de olho nas ações que o pessoal do Rio faz? Porque lá também tem coordenações LGBT.
Eu tenho um diálogo mais próximo com o Carlos Tufvesson, que é da Coordenação Municipal, mais do que com a Coordenação estadual. Mas porque realmente o Carlos faz parte do Fonges, que é o Fórum de Gestores, que foi criado no ano passado, então ele entrou um pouco antes de eu ter entrado na Coordenação e a gente começou a conversar. Mas eu acompanho sim, a gente esteve com o Cláudio Nascimento no ano passado participando até de um programa que teve no canal Fiocruz, a gente sempre acaba prestando atenção. Não só nas coisas do Rio, mas no que sai em outros Estados também. Daí a importância de você ter um fórum de gestores LGBT, que é onde a gente faz essas trocas. Cada Estado tem a sua realidade, mas eu acho que tem muita coisa que serve para todos nós, então é importante sim essa troca.

Em 2012 tem algum desafio maior para a Coordenação?
Tem, para nós aqui do Estado é a eleição do Conselho Estadual LGBT para formar o tripé da cidadania, ele está criado, mas não está eleito. Nós íamos fazer a eleição no ano passado, mas em função da Conferência nós não pudemos eleger. Tivemos que organizar as conferências regional e estadual. Mas neste ano é uma meta que a gente tem e a obrigação do poder público de realmente eleger esse Conselho.

De uma maneira bem clara, o que faz um Conselho LGBT?
Ele ajuda na articulação do que vem de demandas, ajuda na articulação das políticas públicas e a pensar essas políticas para a população LGBT. A Coordenação é um pouco diferente do Centro de Combate à Homofobia, aliás bem diferente. O Centro acolhe, combate a homofobia no município de São Paulo. Aqui não, aqui somos uma Coordenação que tem que fazer, pensar, articular e promover políticas públicas. A homofobia é um dos nossos objetivos sempre, combater a homofobia, enfrentar a homofobia. O Conselho vai ajudar a pensar essas ações, ele é formado por poder público e sociedade civil. Então a sociedade civil vai estar mais próxima da Coordenação, vamos ter se não me engano 10 membros da sociedade civil e 10 do poder público. Nós vamos pensar juntos o que vamos fazer em termos de políticas públicas. É uma participação direta da sociedade civil. Elegendo o Conselho, outro objetivo é articular um novo Plano de Enfrentamento à Homofobia e promoção da cidadania LGBT em cima das propostas que saíram da Conferência Estadual, de 2011.

E tem alguma coisa que de antemão você já está pensando que vai ter que ter dentro do Plano?
Sempre tem o pacote de segurança pública, é uma demanda que vem forte sempre da sociedade civil. Então é preciso políticas que enfrentem a homofobia, ampliar a estrutura da Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), capacitação constante dos policiais. Essa é uma demanda muito forte sempre. E vai ser sempre. A Educação também. O maior desafio na área de Educação é realmente a gente pensar em ter um sistema educacional que desde cedo promova o respeito à cidadania LGBT.

Fora Conselho e Plano, mais alguma ação já prevista para 2012?
No ano passado nós tivemos um curso de ensino à distância que em 2010, na época do Dimitri (Sales), foram feitas vídeos-conferência que resultaram em um curso de ensino à distância que nós tivemos no ano passado para 2.200 funcionários públicos. A maior parte desses funcionários era da área da Educação, da segurança pública, foram cerca de 300 policiais, também abrimos vagas para os municípios. Tivemos uma procura maior do que nós esperávamos e neste ano vamos poder dar novamente esse curso.

Com relação à Saúde a gente está minimamente bem amparados? A gente tem um programa de AIDS que é referência no mundo, em São Paulo tem ambulatório para trans. Não que não seja uma preocupação, mas ela não chega a ser tão importante nesse momento como Educação e segurança pública?
A diferença é que na área da Saúde a gente tem pessoas que têm feito um trabalho muito próximo à própria sociedade civil, têm escutado de perto as demandas, mais sensíveis à questão. Mas eu acho que a gente tem muito que melhorar ainda. Por exemplo, a questão de saúde das lésbicas ainda é um problema a ser enfrentado constantemente. Muitas lésbicas não acessam o sistema de saúde por medo de não terem um tratamento adequado, se sentirem discriminadas quando vão ao ginecologista, não fazem papa-nicolau, as doenças sexualmente transmissíveis entre as lésbicas têm um índice alto. Com relação às travestis e transexuais o ambulatório, é claro, tem que constantemente melhorar. A diferença é que lá a gente sabe que a gente tem pessoas que pensam e trabalham mais próximas das demandas da sociedade civil. Mas na semana passada mesmo eu fiz uma reunião com a Maria Clara Gianna, que é a coordenadora do Programa Estadual de AIDS, então a gente tem sempre um diálogo muito próximo para ver no que nós podemos ajudar para a Saúde poder pensar melhor nessa questão.

No ano passado teve também a entrada da Eloísa de Sousa Arruda como secretária da Justiça, mais ou menos na mesma época em que você assumiu a Coordenação. Agora quase um ano depois dá para dizer que a Secretaria está mais feminina, mais delicada?
A Secretaria da Justiça é uma secretaria que ela tem nos postos-chave a maioria de mulheres, não porque a doutora Eloísa privilegie as mulheres, mas é que realmente as pessoas são capazes. Mas a maioria é mulher, nas coordenações, nos postos-chave realmente são mulheres. As mulheres estão dominando a Secretaria da Justiça. E a doutora Eloísa é uma pessoa muito sensível à área de direitos humanos. Ela já foi para o Timor Leste, ficou seis ou sete meses lá fazendo trabalho pela ONU. É uma pessoa que tem uma visão humanista muito apurada por essa experiência, e também porque ela foi promotora de Justiça durante anos, ela era o terror dos bandidos. Ela tem uma visão muito bacana de direitos humanos. O que a gente tem procurado fazer na Secretaria da Justiça é integrar as coordenações. Então este ano é também uma meta nossa pensar em fazer coisas em conjunto com a coordenação dos negros. Porque a gente pensa muito de forma separada, nós estamos tentando interar um pouco mais. Eu tenho um ótimo diálogo, por exemplo, com o Núcleo de Tráfico de Pessoas, quantas travestis não são traficadas? Gays mesmo também, não com a mesma incidência das travestis, mas também. A gente tem feito um diálogo muito próximo com as outras coordenações, com a dos negros, com o Núcleo de Tráfico de Pessoas, com o Centro de Integração da Cidadania (CIC) para levar coisas sobre diversidade sexual para a periferia. No ano passado eu fui dar uma palestra em Heliópolis, foi muito bacana, uma das melhores experiências que eu tive desde que eu cheguei aqui. Porque na plateia a maioria das pessoas era senhoras da comunidade de Heliópolis, senhoras mesmo, não era uma plateia formada por gays, lésbicas, a maioria era heterossexual, senhoras e jovens, da comunidade que foram lá conhecer mais sobre diversidade sexual. É uma Secretaria que hoje está com uma alma bem feminina mesmo. Bem cor-de-rosa. Se bem que a doutora Eloísa é uma mulher muito firme, muito exigente. Desde que entrei aqui tenho tido muito apoio do gabinete, tanto dela quanto do secretário adjunto, do chefe de gabinete. A gente tem tido todas as condições, claro que dentro do possível, para realizar nosso trabalho aqui.

Porque às vezes o governo cria para posar de bonzinho e não investe, não faz acontecer.
Exato. A gente tem tido um diálogo muito próximo. Isso acaba facilitando também que as coisas cheguem ao governador, o governador acaba também tomando conhecimento das nossas necessidades. Isso torna a coisa mais fácil.

pride

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